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Precificação: mais do que monitorar o mercado, é preciso conhecer seu negócio

Processo de pricing ganha importância nas companhias como pilar de sustentação do crescimento de vendas

Conhecimento dos negócios que gere, do setor em que atua e dos consumidores desejados. Noções dos meandros do sistema tributário do país. Entendimento do perfil demográfico de sua região. Percepção do preço por parte do cliente. Monitoramento de concorrentes. Acompanhamento do cenário econômico. Estes são apenas alguns dos conceitos que estão presentes no método de precificação dos produtos que uma companhia vende.

O processo de pricing é muito mais do que buscar uma margem de lucro que remunere a operação. É um trabalho árduo e complexo, que pode te posicionar à frente das demais companhias do segmento. Ao contrário, uma estratégia precipitada pode custar dinheiro ao empresário. Uma das principais dificuldades para acertar nos preços do seu comércio é a falta de uma receita única: cada um precisa entender as especificidades de sua realidade para realizar bem a tarefa.

Segundo a pesquisa “O Verdadeiro Valor do Pricing – Da estratégia de preços à excelência comercial”, da consultoria Deloitte, há no Brasil um movimento de aumento de importância e de atuação da área a partir de um olhar estratégico de diferenciação dos segmentos de clientes. “Ou seja, uma abordagem que vai além das análises tradicionais de custo e concorrência”, indica o texto.

Para Ricardo Fernandes, presidente da Associação Brasileira de Pricing (ABPricing), a melhor prática do mundo é, sem dúvidas, o profundo conhecimento das metodologias e estratégias que podem ser utilizadas para cada segmento de mercado, produto, serviço, categoria de cliente e canal de venda. “Não existe a melhor ou a pior, existe a mais correta para cada cliente. Para isto, se faz necessária uma célula em cada empresa capacitada a explorar este imenso universo de variáveis antes de se precificar. Depois que se adquire esta expertise, é fácil perceber o aumento da lucratividade.”

Boas práticas nesse sentido começam com uma clara estratégia empresarial, que irá refletir diretamente na estratégia de preços e posicionamento de marca no mercado, afirma Frederico Zornig. O sócio fundador da QuantiZ Pricing Solutions também enxerga a precificação como um processo amplo, com diversas frentes de atuação.

“Precisamos definir e monitorar ações dos principais concorrentes. É fundamental estruturar listas de preços e políticas comerciais coerentes com cada canal de atuação e região do país, dada a complexidade tributária e níveis de competitividade distintos em cada local. Todo esse trabalho precisa ser feito como um processo contínuo e dinâmico, preferencialmente apoiado por pesquisas externas de preços e indicadores de gestão apropriados”, considera.

Fato é que uma boa estratégia de preços pode fazer a empresa crescer exponencialmente, deixando concorrentes diretos e indiretos para trás. Fernandes acredita que a precificação correta pode transformar sua companhia em uma potência de seu segmento de mercado. Ao mesmo tempo, a tática errada de pricing pode afetar negativamente um negócio, com perda constante de receitas e volume de vendas.

Zornig também avalia o preço como a principal alavanca de resultados para uma empresa. “Estudos demonstraram que 1% a mais de captura de preços pode alavancar o lucro líquido em mais de 10%. Portanto, quanto menor for a margem de um negócio, mais relevante ainda uma estratégia e gestão de preços bem executadas”, completa.

Carga tributária

Os impostos influem diretamente na hora da precificação. Conforme relata o advogado e consultor Alexandre de Jesus, do escritório Lopes & Castelo Advogados, quando o preço de um produto é definido, a carga tributária incidente sobre ele é de fundamental relevância.

“No Brasil, somente no que se refere ao Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS), cada estado possui sua legislação própria e o preço deve ser definido considerando a alíquota incidente na região onde a mercadoria será comercializada. Além disso, há o PIS/Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), o Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI) e outros tributos diversos”, detalha.

Considerando a complexidade da legislação brasileira, no que tange às questões tributárias, é preciso tentar faze-la de aliada para reduzir custos e aumentar a margem de lucro, ainda que seja um processo difícil. Primeiro, é preciso que o empresário conheça todos os impostos incidentes na operação de compra e também na operação de venda, para assim tentar chegar a um bom preço final.

“Um ponto que pode ser benéfico é a verificação de Regimes Especiais de Tributação, em que o estado permite que a operação fiscal de determinada empresa tenha uma situação diferenciada das demais. Isso acontece nos casos em que, por atendimento à legislação vigente, nem o contribuinte, nem o estado são beneficiados com a tributação”, aconselha Jesus.

Ainda conforme o advogado – que também é professor de Finanças e Tributos na Universidade Cruzeiro do Sul –, o ramo varejista, pela grande quantidade de produtos circulando, é muito influenciado pelas questões tributárias. Com todos os setores afetados pelos tributos, o importante é que as empresas acompanhem constantemente a legislação, com o intuito de se adaptarem mais rapidamente às alterações, ganhando competitividade.

Como acertar na hora do preço

Mesmo com os conceitos iniciais sobre impostos e visão geral e sistêmica de pricing na cabeça, não é fácil acertar a mão em meio a tantos detalhes. Zornig, por exemplo, aborda a questão do poder fazer mais do que o realizado. Para ele, é um erro as companhias acreditarem que basta ter resultados aceitáveis. Essa postura passiva, acredita, pode significar muito dinheiro deixado sobre a mesa ao negligenciar melhores maneiras de gerir preços.

“Outros erros que observamos estão relacionados a falta de estratégia ou demasiada importância ao curto prazo, sacrificando posicionamentos de marca em troca de preços baixos para alavancar o volume. Isso pode se tornar um ‘cobertor curto’, que dá conta de um mês e não de outro. Ou, o que é ainda pior, reduzir a percepção de valor da marca do produto no longo prazo”, analisa.

Em relação aos tributos, também é possível observar erros de planejamento. Alexandre de Jesus afirma que costumeiramente verifica o desconhecimento, por parte das empresas, dos tributos incidentes na precificação dos seus produtos. O advogado identifica, ainda, a desinformação em relação aos fornecedores (se são indústrias, revendedores ou uma empresa do Simples Nacional) – informação que impacta no pricing.

O presidente da ABPricing, Ricardo Fernandes lista os enganos mais comuns com os quais já se deparou: não saber como influenciar os clientes na hora da venda; aumentar preços sem melhorar a comunicação de valor; reduzir preços com intuito de vender mais, errando na comunicação da oferta; não capacitar os negociadores continuamente, fazendo com que a estratégia não chegue 100% correta ao consumidor final; vender para o cliente certo pelo canal de vendas errado; e não ter “gatilhos de vendas” que levem o cliente ao “ponto futuro”, fazendo o preço e o valor da venda despencarem na hora da negociação.

O olhar do cliente

Não basta ao empresário realizar a estratégia de precificação correta apenas do lado de dentro de sua operação. Após considerar todos os itens que influenciam neste processo, é necessário entender a resposta daquele que mais importa, no fim das contas: o consumidor. As impressões do cliente são de fundamental relevância e devem ser mensuradas para atingir o sucesso.

Há algumas ferramentas que auxiliam o empresário na hora de entender melhor esse cenário. Zornig aponta, por exemplo, que o valor percebido pelo cliente – caso seja um consumidor – é usualmente apurado com pesquisas específicas, como uma conjoint analysis. Se o cliente é B2B (business to business), é possível estimar por meio de levantamento de dados do consumidor, sempre buscando entender, em sua ótica, qual o valor que o produto da sua empresa gera nos negócios dele.

“O método não é tão simples quanto possa parecer, mas se a sua empresa possui diferenciais, esta é a melhor maneira de precificar, pois assim poderá atingir níveis de captura de valor mais precisos e em linha com o que os seus produtos geram de benefícios aos clientes”, diz o fundador da QuantiZ.

Para Fernandes, a percepção de valor pelo cliente é, sem dúvidas, o divisor de água para se vender pelo melhor preço – ou simplesmente vender. “É complicado mensurar a visão do consumidor, mas é possível influenciá-la, valorizando mais os produtos e serviços. Para que isto ocorra, se faz necessário um profundo conhecimento das alternativas dos já citados ‘gatilhos de venda’ e ‘ponto futuro’. Somente assim é possível fazer com que os clientes valorizem o que é vendido de forma efetiva.”

Também é importante saber ressaltar aos olhos do cliente o valor agregado que o seu item carrega. Segundo Zornig, muitas empresas com alto nível de diferenciação em um produto ou serviço acabam deixando de cobrar por isso, entrando um cenário de guerra de preços, resumindo a estratégia em seguir os competidores ao reduzir valores. Ou seja: se a sua empresa possui algum diferencial, cobre por ele!

Elasticidade

De acordo com Fernandes, a análise deste relevante conceito se dá pela medição do aumento de volume perante uma pontual redução de preços e vice-versa. O maior problema para trabalhar aqui está nos equívocos que cometemos ao analisar apenas estas duas variáveis, esquecendo da influência externa e da comunicação. Neste caso, surgem os “falsos-inelásticos” e os “falsos-elásticos”.

“De qualquer forma, um especialista em precificação precisa ter conhecimentos profundos sobre o tema, pois erros na análise de elasticidade não podem ser comuns, tendo em vista o grande impacto que têm na lucratividade do negócio. Como sempre digo: um bom especialista em preços não pode ter a cabeça ligada somente a números. Ele precisa olhar para o mercado, para os clientes e pensar fora da caixinha”, articula o presidente da ABPricing.

Em uma explicação mais técnica, Zornig detalha: elasticidade é a relação preço e volume do produto. Ou seja, se aumentar o preço em 10% e o volume cair 20%, o índice de elasticidade de um item é 2. Sendo assim, o produto é elástico – bastante sensível a variação de preços. Se no exemplo, o volume tivesse variado apenas 5%, a elasticidade seria de 0,5 – inelástico.

O especialista afirma: “produtos elásticos tendem a ser mais comoditizados, enquanto os inelásticos, em geral, são os mais diferenciados. Isso pode variar de item a item e na direção do que está provocando as alterações de preços. Um produto líder de categoria, por exemplo, tende a ser elástico nas reduções de preço, pois os clientes o querem. Para os pequenos aumentos, porém, podem apresentar comportamento inelástico em função da força da marca e qualidade percebida”.

Em resumo...

Em sua trajetória como presidente da ABPricing, Ricardo Fernandes viu nascerem excelentes estratégias de pricing. Por questões contratuais, ele não pode detalhar as companhias, mas deixa uma dica. “Aos leitores mais curiosos, sugiro analisarem os modelos de precificação utilizados há 10 anos versus os atuais, nos seguintes ramos: transporte aéreo, bebidas (cervejas, chás, água, sucos, destilados, vinhos e refrigerantes), fretes, seguros e alimentação (carnes, embutidos, iogurtes etc.).”

Ele considera não ser difícil perceber que houve uma revolução na comunicação de valor e, consecutivamente, um aumento significativo de preços em alguns produtos. Ainda assim, o consumidor paga sem reclamar, devido ao valor percebido em cada um deles.

No que se refere às influências legais e tributárias, Jesus acredita que o conhecimento dos impostos incidentes nas operações de compra e venda em cada região, bem como do tipo comercial do fornecedor – indústria, distribuidor, Simples Nacional – já minimiza as chances de cometer erros, auxiliando na atuação do pricing. “É necessário, ainda, alinhamento prévio com o fornecedor para que qualquer alteração realizada na carga tributária dos produtos seja informada”, completa.

Para finalizar, Zornig dá uma dica relativa aos concorrentes: só devemos acompanhar as movimentações daqueles a que somos vulneráveis. “O que quero dizer é que competimos com apenas uma ou duas marcas no mercado. Se uma delas consegue tirar seu market share ao reduzir preços, dependendo do nível de elasticidade que seu produto tenha em relação ao competidor, faz sentido acompanhar. Mas em outras situações, não. Por outro lado, não preciso seguir as marcas que não concorrem exatamente comigo. Isso acaba sendo um ‘tiro de canhão’ para matar uma formiga”, sintetiza.

Dados que indicam mudanças – BOX

Números do levantamento “O Verdadeiro Valor do Pricing – Da estratégia de preços à excelência comercial”, da consultoria Deloitte

• 38% das empresas possuem estratégia de preços estruturada e alinhada à estratégia corporativa

• 32% têm área ou profissional exclusivo para a gestão de preços

• 51% dos responsáveis pelo pricing são diretores; 35% gerentes

• 54% das empresas consideram como critérios para formação de preço o custo + margem + preços da concorrência

• 50% também leva em consideração, além dos itens anteriores, a elasticidade de demanda + preço com base no valor do cliente

• 53% utilizam ou pretendem utilizar análise de big data como fonte de informação no ambiente digital

Esse texto foi escrito para a Beauty Fair por intermédio da agência DayBook. O material não está mais online e foi disponibilizado aqui somente como parte do portfólio. Essa é a sua versão original, sem edição dos outros profissionais envolvidos. A imagem é licenciada para utilização gratuita.